Introdução
Esta é uma perspectiva histórica do desenvolvimento da técnica de liberação miofasicial atualmente referida como Reposicionamento Muscular (RM). Curiosamente, no início da criação do RM não houve intencionalidade, isto é, não houve o objetivo de criar nada. Ao contrário, este trabalho aparentemente ?surgiu? a partir de alguns elementos ou ?fatos?, a seguir descritos, que se amalgamaram ao longo do temporesultaram neste modo de mobilizar a miofáscia, ainda em desenvolvimento. É possível,bem provável, que haja outros elementos, dos quais ainda não temos consciência,que também têm sua parcela de participação na constituição do RM. Esta é apenas uma biografia preliminar do assunto, seguida das suas principais característicasperspectivas futuras.
O ressalto (fato 1):
Pensando retrospectivamente, tudo começou em meu treinamento básico em Rolfing®, quando aprendi uma manobra no trato iliotibial, na qual o praticante vai deslizando o braço na face lateral da coxa do cliente no sentido cranial. Aplicando tal manobra, diversas vezes senti um movimento repentino da musculatura abaixo da área sobre a qual exercia pressão. Produzia-se algo parecido com a reacomodação de tecidos moles sob a pressão exercida, criando um ressalto, como quem desce abruptamente um degrau. Aquilo criava uma sensação estranha, tanto para o terapeuta quanto para o cliente, que muitas vezes se assustavareferia dor.
Naquela época, meus professores não tinham resposta sobre a natureza daquele fenômeno, que despertou a minha curiosidade.
Experimentei ocorrências semelhantes, tanto como terapeuta quanto como cliente, nestaem outras partes do corpo. Lembro-me especialmente de estar recebendo um toque a quatro mãos do professordo assistente na região do serrátil anterior quando fomos, todos, surpreendidos pela ocorrência deste fenômeno, que eventualmente cria até um som surdofugaz.
Retrocedendo ainda mais no tempo, o ressalto me lembra de uma brincadeira, uma exploração que fazia comigo mesmo quando ia ao cinemacolocava o braço descansando sobre o encosto da poltrona vizinha. Costumava brincar com movimentos de ?encaixardesencaixar? a escápula, facilitado que era por aquela posição. Tais movimentos também provocavam ressaltos. Percebo então que esta história começa bem antes de minha formação em Rolfing, como mencionei antes, mas já na adolescência, quando aquele ?encaixardesencaixar? já me intrigava. ?O que será isso??, era meu diálogo interno na época.
Curioso também é perceber atualmente meu filho, que costuma sentar-se em minhas pernasapoiar-se em mim das mais diversas maneiras, brincando de produzir este ?vaivem? dos músculos de minha coxa, provocando assim esta mudança abrupta na posição relativa dos compartimentos miofasciais (começo, agora, a introduzir os termos técnicos propositadamente)se divertindo com os ressaltos que isso provoca.
Voltaremos a este possível aspecto atávico mais adiante.
Hoje, muito tempo depois de minha formação como rolfista (e muito mais ainda das sessões de cinema da adolescência!), o ressalto entre compartimentos miofasciais se mostra como um dos principais guias deste tipo de toque que vimos usando (eu, minha equipenossos alunos),que tem sido oferecido à comunidade do Rolfing sob a forma de cursosgrupos de estudo. À medida que o trabalho se transforma, o mesmo ocorre com sua denominação: inicialmente foi chamado de Rolfing Cirúrgico, depois de Toque Cirúrgicoatualmente nos referimos a ele como Reposicionamento Muscular, na falta de nome melhor.
Mas o que é o ressalto, afinal? Provavelmente trata-se de uma reacomodação dos tecidos moles diante de uma solicitação mecânica particular, como discutido abaixo.
O que é o ressalto?
É muito difícil, ainda, sabermos exatamente comoonde ocorrem os movimentos relativos internos aos quais nos referimos. Os exames de imagem ainda não permitem que tenhamos uma filmagem do que ocorre na intimidade dos nossos tecidos móveis enquanto nos movemos (ou enquanto estamos sujeitos a uma força externa, como é o caso das terapias manuais). Esta realidade já está mudando com o desenvolvimento de novas técnicas de ressonância magnética. Por enquanto, temos um modelo que busca explicar o mecanismo dos ressaltos:
Se lembrarmos que os compartimentos miofasciais são praticamente inextensíveisestão mantidos sob um regime constante de forças (especialmente pressãotensão) pelo arranjo que formam em conjunto com os ossos, cria-se uma situação na qual o organismo está sujeito a uma contínua competição por espaço interno entre os vários elementos ou tecidos que nos constituem. Esta competição é acentuada pelos movimentos corporais, especialmente se estes se aproximarem das amplitudes máximas das articulações. Ao nos movermos, a posição relativa dos ossosdos compartimentos miofasciais se modifica, criando verdadeiras trajetórias de movimentos internos (entre ossos, músculos, tendões etc) que correspondem aos movimentos externos, visíveis, que podemos produzir. Basta caminhar palpando a região do trocanter maior do fêmur para se ter uma idéia de tais movimentos internos.
Ao longo de tais trajetórias de movimentos internos, as diferentes estruturas envolvidas pressionam-sese tensionam mutuamente de forma particularespecífica, o que resulta em resistência (atrito) variável durante estes percursos. Isto pode ser experimentado ao palparmos novamente a região do trocanter maior do fêmur durante o movimento de fletirestender a perna enquanto apoiamos sobre ela. Explorando-se este movimento, normalmente é possível perceber que existe uma resistência de movimento entre os tecidos moleso trocanter que cresce progressivamente – o movimento entre tecido moleosso parece difícil- e, repentinamente caia continuidade do movimento é fácilele se completa rapidamente. Em outras palavras, parece que dois compartimentos, quando em movimento mútuo, sofrem uma resistência crescente, o que leva a um aumento das forças envolvidas para que o movimento prossiga. Tais forças (pressão, tensão) aumentam até que atinjam certo limiar, a partir do qual a resistência decresce rapidamenteas estruturas movem-se abruptamente: um ressalto torna-se evidente.
Nossas observações clínicas sugerem que um alto grau de resistência aos movimentos internos (avaliada pela palpação) corresponde a grandes restrições motoras clinicamente observáveis. O atrito elevado leva também à sobrecarga mecânicaassim ao desgaste tecidual (e consequentemente à ocorrência de sintomas). Isto é, os ressaltos mais intensos nos guiam para as restrições estruturais mais importantes. O toque pode, quando adequadamente direcionado, mimetizar a ocorrência dos ressaltosnos auxiliar no diagnósticona abordagem manual, visando amenizar a resistência aos movimentos internos.
É importante lembrar que os ressaltos teciduais com significância clínica são aqueles que estão associados a restrições motoras manifestas funcionalmente. Para diferenciar um ressalto ?funcional?, que merece atenção, de um ressalto ?não funcional? é necessário adicionar mais um elemento ao toque: a relação com o que chamamos de ?eixo?, como será descrito abaixo.
Movimentos espontâneos de auto-manutenção (fato 2):
Durante a segunda fase de meu treinamento (practitioning), nos hospedávamos na casa onde se dava o curso. Na noite de um dia repleto de sincronicidades, excitado, tive dificuldade de conciliar o sono. Num dado momento, senti como se um dedo de minha mão esquerda ?quisesse mover?, sem que tivesse recebido o comando para tal. Era uma sensação prazerosaeu cuidei de não me mover, temeroso de perdê-la. Momentos depois, senti como se este dedo estivesse realmente se movendo e, abrindo os olhos na penumbra do quarto, pude ver que isto realmente acontecia. Inicialmente pequenoslimitados ao dedo, estes movimentos foram se intensificandoalastrando a ponto de tomar todo o braçoa seguir também o tronco. Duraram, julgo, cerca de três horas desta noite na qual mal dormi. No entanto, apesar de insone, a sensação era a de estar descansando. Na manhã seguinte, revigoradoem paz, lembro-me de depor no círculo de abertura do treinamento que ?o mundo poderia acabar a qualquer momento que tudo bem…. sentia-me como uma montanha….?
Anos depois, alguns dias após o início de uma prática de meditação (Meditação Transcendental) volto a experimentar movimentos espontâneos comparáveis àqueles acima descritosque até hoje ocorrem. São movimentos de vários tipos (clônicos, tônicos, balísticos, tremores etc)todos eles têm, na minha experiência, a qualidade de serem auto-reguladores ou auto-curativos, pois claramente se dirigem às restrições estruturaisas amenizam. Alguns clientes exibem movimentos semelhantes durantes o trabalho de RM.
Esta classe de movimentos espontâneos parece fazer parte de um sistema natural de auto-manutenção, similar aos movimentos de espreguiçar, bocejar etc. O toque do RM parece acessar este possível sistema auto-regulador, já que observamos (e medimos) atividade tônica involutária similar. Ademais, pudemos observar outros tipos de movimentos reflexos durante as manobras, como veremos adiante.
Assim, é possível traçar um paralelo deste tipo de comportamento motor involuntário de auto-manutenção com manifestações motoras observadas durante as manobras de RM.
A natureza cirúrgica do toque (fato 3):
Em algum momento entre os anos de 8687 fui conversar com um ex professor de ortopediaentão conselheiro, Dr. João A. Rossi.
Naquela época, costumava apresentar-lhe meus projetos, sobre os quais ele então opinava, dava conselhosfazia considerações. Um dos projetos em discussão era aprender Rolfing, método sobre o qual ele não tinha conhecimento. Expliquei-lhe, então, como era a técnica de manipulação usada no Rolfing, que propunha a separação dos compartimentos musculares anormalmente aderidos etc. Recordo até de palpar seu antebraçopressionar os músculos entre si ? o que provocou os já mencionados ressaltos.
Ao ouvir isto, Dr. Rossi então recosta, faz uma pausa pensativaarremata: ?quer dizer que com este negócio de Rolfing, você opera por fora?? (os grifos são nossos)
Eu, meio desorientado, ri como se fosse uma piada. Achei aquilo uma impossibilidade. Como poderia alguém operar por fora da pele?
Reencontrando a cirurgia
Apesar de ter cursado medicina, sempre fui avesso a sanguea procedimentos cruentos. No entanto, durante a graduação, participei de várias cirurgias como aluno -desejei esquecê-las. Mas repentinamente, já profissional de Rolfing, sou subitamente lembrado do tipo de manobra cirúrgica chamada divulsão romba. Numa dada sessão de Rolfing, ao aplicar uma manobra miofascial, pude sentir claramente a separação de duas estruturas vizinhas sob a pele. A seguir veio vividamente à minha consciência a cena do Dr. Rossi falando em ?operar por fora?. Sim, era realmente possível, conclui em silêncio, operar por fora. Lembrei-me, então, nas cirurgias a que assisti, dos cirurgiões afastandoseparando estruturas com as mãos, a fim de atingir um determinado local. A própria tesoura, um instrumento cortante, é freqüentemente usada às avessas; introduzida fechada, ela é usada para separar estruturas com suas bordas rombas enquanto é aberta.
Hoje este conceito está definitivamente estabelecido em nossa abordagem manual. Todos os colegas familiarizados com cirurgias para os quais mencionei que o toque ?produz a divulsão romba das fáscias por cima da pele? imediatamente compreenderam o conceitonenhum questionou tal possibilidade. Um destes colegas me lembra que um famoso cirurgião ortopedista dizia que ?o melhor instrumento é o dedo?. Vários clientes-cirurgiões até reconhecemmencionam quando este tipo de separação está ocorrendo com eles ao receberem o trabalho.
Como todo cirurgião sabe, quanto menos corte, melhor. Haverá menor sangramento, menos cicatrizesa recuperação é menos dolorosamais rápida. É por isso que, para separar duas estruturas distintas, ao invés de cortá-las, se usa a chamada divulsão ou dissecação romba (isto é, não cortante), na qual se afastam estruturas vizinhas uma da outra com um instrumento não cortante (rombo), preferencialmente os dedos (pois além de rombos, são sensíveis).
Este processo de separação pode ser comparado com aquele que fazemos ao separar os gomos de uma mexerica. A distinção potencial entre os gomos já existeé possível separá-los na fronteira entre o revestimento (?fáscia?) de um com o revestimento do outro. Este espaço potencial entre duas estruturas anatômicas justapostas chama-se plano de clivagem, pois é nele que a separação (clivagem) pode ocorrer naturalmente. Ou seja, o organismo é constituído de uma infinidade de partes colocadas lado a lado entre as quais é possível se abrir caminho apenas afastando-as.
Hábitos motores limitados, traumascirurgias podem produzir aderências nos revestimentos dos músculos (fáscias) obliterando os planos de clivagem. A manipulação das fáscias pode ser dirigida para separar novamente estas superfícies, devolvendo-lhes o espaço virtual que ali normalmente existe,que é primordial para que se movam normalmente.
?Algo diferente? surge na prática clinica ? ?o eixo? (fato 4):
Desde a minha ?redescoberta? da cirurgia, passei a trabalhar dando atenção a esta possibilidade do toque: de efetivamente buscar sentir (clienteterapeuta) uma separação entre estruturas durante o trabalho de manipulação.
Naquela época ? aproximadamente entre os anos de 9497 ? durante sessões em colegas rolfistas, comecei a ouvir deles observações tais como: ?Fernando, o que você está fazendo?? enquanto fazia uma manobra supostamente conhecida por ambos.
Relatos semelhantes foram se repetindo a ponto de evidenciarem a possibilidade de haver algo diferente no toque que vinha usando. Isto despertou minha curiosidadea vontade de sentir como seria este toque aparentemente diferente.
Foi num destes episódios, em que mais uma vez ouvi ?o que é isto?? enquanto fazia uma manobra, que convidei o colega Alfeu Ruggi para uma experiência: aplicar manobras em mim, de acordo com a maneira que eu julgava estar fazendo. Isto é, eu tentaria instruí-lo para aplicar a manipulação daquele modo específico, a fim de que pudéssemos caracterizá-lo.
Este foi o inicio da investigação empírica que se estende até hojeque vem dando formato ao trabalho. Durante este processo, sempre com a colaboração de colegas rolfistas, vimos procurandodescrevendo as variáveis que nos parecem estar presentes nesta qualidade de toque.
Nesta fase, além do ressaltoda característica cirúrgica do toque, mais um elemento mostrou-se presente na técnica do RM: foi a conceituação do que veio a ser chamado de ?eixo?que provavelmente representa uma função inerente à motricidade. Foi assim batizado pela semelhança que guarda com o conceito de ?eixo? presente em algumas artes marciais orientais como o Tai-Chi-Chuano I Chuan.
Inicialmente consideramos ?eixo?, ou melhor, ?função do eixo? a situação na qual a palpação cria a unificação dos diferentes segmentos corporais, que assim formam um bloco únicofirme. Esta firmeza pode ser sentida tanto pelo terapeuta como pelo clienteé a partir desta condição que o trabalho de RM pode ocorrer.
Este conceito, inicialmente restrito a uma sensação táctil, tem se mostrado mais amplo, a ponto de considerarmos ser um elemento da própria fisiologia do movimento. Recentemente pudemos inclusive medir atividade tônica involuntária com técnicas de eletromiografia quando o toque está conectado ao eixo. Assim, a função do eixo poderia ser comparada à função tônico-posturalo toque conectado ao eixo parece estimular tal função (durantedepois da manipulação). Se verdadeiro, este fato pode abrir um amplo leque de reflexõesinvestigações, como discutido adiante.
Em resumo,conectando os fatos acima mencionados, o RM pode ser considerado um trabalho de manipulação comparável a uma ?cirurgia através da pele? (fato 3), que se baseia numa função tônica involuntária batizada de ?eixo? (fato 4), comparável à uma atividade motora espontânea possivelmente de auto-manutenção (fato 2)que, para ser encontrado, tem como referência o ?encaixar-desencaixar? abrupto entre estruturas miofasciais batizada de ?ressalto? (fato 1).
Complexidade analíticasimplicidade experiencial
Além destas quatro variáveis iniciais, encontradas ao longo do processo de análise deste trabalho, temos encontrado outras mais, sugerindo que poderia se tratar de uma técnica potencialmente complexaque dependeria de um sem-número de instruções. No entanto, isto contrasta radicalmente com a sensação que se tem durante o trabalho propriamente dito, de simplicidadesíntese.
Talvez este fato seja conseqüência do próprio processo analítico de investigação, pois inicialmente o trabalho simplesmente ?aconteceu? como algo sintéticoque, a posteriori, vem sendo fatiado em suas partes, o que aparenta complexidadenão reflete a realidade.
Esta maneira de trabalhar parece trata-se de um modo ou estado em que é possível ?entrar?quando nele, ambos, clienteterapeuta, são capazes de reconhecer. Este reconhecimento mútuo sugere que possa haver algum mecanismo neurológico atávico como pano de fundo, para o qual estamos programados, como veremos a seguir. Tratar-se-ia, então, simplesmente, de deixar ?rodar? o programa.
Temos observado que esta maneira de trabalhar é mais eficaz, precisa,por isso também econômica. Além disso, é possível trabalhar ?brincando?, explorando as diversas maneiras de achar o ?eixo?, em contato constante com o cliente, especialmente a respeito das sensações suscitadas pelo toque. Assim, ambos, clienteterapeuta, podem apropriar-se mais de seus respectivos eixos (função tônica) ao final de uma sessão. Desse modo, além do cliente, o terapeuta também pode beneficiar-se da prática do trabalho.
Reconhecimento mútuo de adequação do estímulo (o estímulo é apropriado)
Durante os cursos de RM, uma das questões que aparecem com mais freqüência diz respeito a encontrar o ?eixo? durante o toque.
Uma das razões mais comuns de se perder o contato com o eixo é, aparentemente, o uso de força muscular, quando na técnica do RM, usa-se o peso do corpo do terapeuta.
A experiência de classe tem mostrado que assim que o terapeuta passa a usar o peso ao invés da força, ele(a) sente que fica mais fácilmais gostoso de trabalhar. O toque parece ?fazer sentido? se feito deste modo. Além disso, simultaneamente, o cliente também reconhece que o toque mudou de qualidade, que está mais gostoso apropriado à sua necessidade. É freqüente ouvir frases como ?é aí?, ?não saia daí!?, ?este é o centro da questão!? etc.
É muito curioso perceber, que ambos, clienteterapeuta, notam, simultaneamente quando a qualidade do toque torna-se apropriada. Este fato sugere que possivelmente estamos diante de algum tipo de comportamento atávico, que reconhece o que é adequado tanto para o cliente quanto para o terapeuta. Algum tipo de mecanismo de cuidado mútuo, semelhante àquele observado nos primatas, quando cuidam da pelagem dos semelhantes (grooming).
Se é possível sentirreconhecer quando estamos fazendorecebendo estímulos adequados, podemos pensar nos possíveis empregos das sensações estimuladas pelo toque. Notamos na pratica clínica que as tais sensações parecem respeitar alguns padrões. Por exemplo, sensações de segurança, de firmeza, de estabilidade, de conexão de partes; sensações de pressão-queimação-tensão que migram em certos padrões durante o desenrolar de uma manobra, etc.
Sendo assim, impõe-se a pergunta: será possível descreverclassificar as sensações associadas a este tipo de toque? E, a partir de tais descrições, elaborar protocolos de pesquisas qualitativas capazes de reconhecer nexos em tais padrões sensoriais? Estudos deste tipo poderiam auxiliar no reconhecimento da qualidade do toque (tanto para o terapeuta quanto para o cliente). Este tipo de pesquisa poderia trazer mais objetividade para o ramo das terapias manuaisser útil em vários níveis: no processo de ensino-aprendizagem, na clinica diáriano desenvolvimento de novas técnicas.
A interface toquereflexos tônico-posturais
Uma das principais características do toque do RM é que ele une vários segmentos corporais em um único bloco (conceito de eixo). Durante as manobras, se o terapeuta chacoalhar suavemente o cliente, ambos podem reconhecer que o corpo reage como um todo; isto é, os movimentos se transmitem em fase (simultaneamente) nas várias partes engajadas pelo toque.
Inicialmente descrevemos este fato como mera conseqüência do tensionamento passivo das estruturas miofasciais. No entanto, duas outras observações nos levaram a pensar que poderia haver mediação do sistema nervoso naquela firmeza perceptível à palpação. Usando a técnica RM na região occipital, pudemos notar: a) atividade involuntária tônica da musculatura eretora cervical, criando extensão da cabeçado pescoçob) movimento dos olhos de um lado para o outro (nistagmo), visíveis pelos movimentos da córnea por baixo da pálpebra.
Tais observações levaram à hipótese: ?Será este tipo de técnica capaz de estimular ocorrência de reflexos neurológicos??
A partir daí iniciamos um projeto piloto no qual usamos leituras de eletromiografia (EMF) em alguns grupos musculares durante as manobras de RM.
Inicialmente, foram colocados eletrodos na musculatura eretora cervical, bilateralmente, no nível de C3-C4aplicou-se uma manobra de RM na região da linha nucal. Foi emocionante notar, pela primeira vez, a atividade eletromiográfica que apareceu alguns instantes depois do início da manobra. Observamosmedimos reações mantidas (tônicas) em todos os sujeitos que participaram deste estudo, 12 até agora.
Além destas medições, pudemos medir também atividade abdominalcervical durante manobra na região do arco costal.
O trabalho vem se transformando
O fato de termos medido atividade reflexa tônica em todos os sujeitos que participaram de nosso estudo piloto sugere que a possibilidade de se evocar tais reflexos pelo toque do RM seja universal. Ademais, durante as medições observamos uma latência relativamente grande (aproximadamente um minuto) entre o início de uma manobrao início da atividade eletromiográfica, momento a partir do qual acentua-se a firmeza perceptível pelo toque. Especulamos, a partir de tais observações, que a presença da atividade tônica reflexa aumenta a efetividadea profundidade atingida pela manobra. Quando a atividade reflexa é mais intensa, o terapeuta passa a notar maior movimentação tecidual sob suas mãos (divulsão romba)o cliente sente que o toque atinge maior profundidadevai ?onde é necessário?, eventualmente acompanhando-se também de queimação, pontadassensações afins.
Apesar de tais experiências poderem atingir grande intensidade, notamos que o reconhecimento de adequação por parte do cliente é um ponto crucial: isto garante que a experiência seja algo positivoevita que os reflexos de retirada se manifestem (o que poderia transformar o toque como uma experiência negativaportanto inadequada).
Estas observações têm nos levado a explorar mais profundamente a questão dos reflexos estimulados pelo toque. Temos experimentado toques – sempre conectados ao eixo – maismais duradouros, aguardando as reações do cliente. Algumas sessões eventualmente se resumem a uma ou duas manobras.
Este maior tempo de espera tem nos dado a oportunidade de observar a ocorrência de outros tipos de reflexos, além dos tônicos. Reflexos clônicostremores têm se mostrado mais frequentemente, o que tem fortalecido a hipótese deles fazerem parte de um sistema auto-regulador, como referido anteriormente (fato 2).
O conjunto destas observações nos move no sentido de aprofundar a pesquisa das reações reflexas com o uso da eletromiografia. Este método pode trazer maior objetividade no ensino, na clínicana pesquisa desta abordagem terapêutica, possivelmente trazendo também maior reconhecimento do trabalho manual pela comunidade biomédica.
Nossa equipe é composta por Fernando Bertolucci, Yeda Bocaletto, Angela Freiberg, Soraia Pachioni. Convidamos os colegas interessados neste tipo abordagemque ainda não conhecem nosso trabalho a compartilhar conosco desta experiência.
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