Após a apresentação da pesquisa sobre Rolfing Imagem Corporal, na reunião anual, foi pedido que eu contasse um pouco desta experiência, em nosso jornal, a fim de que mais rolfistas tivessem acesso a essa informação.
Em 2000 quando participei do SE® avançado em Florianópolis terminei a formação com muitas perguntas. Somente mais tarde percebi que essas questões eram complexasnão poderiam ser respondidas por ninguém, além de mim mesma. Minhas questões referiam-se principalmente ao comportamento do professor Peter Levine frente as mais variadas atitudes das pessoas por ele tratadas. Foi a partir daí que fui encaminhada por uma colega, Maria das Graças psicóloga de Belo Horizonte, à uma professora da pós-graduação da Faculdade de Educação Física da UNICAMP. Essa professora chamada Consolação (irmã da Mª da Graça), somente me recebeu por ter sido um pedido de sua querida irmã, pois a princípio havia um grande preconceito por eu ser rolfista.
Para a professora Consolação, rolfista era sinônimo de alguém que não respeitava os limites do outro, alguém que fazia intervenções extremamente invasivasque não tinha noção da complexidade desse tipo de abordagem frente ao psiquismo do cliente.
Foi durante uma conversa que fui aceita por ela, para ser orientada numa pesquisa de mestrado que envolvesse o Rolfinga Imagem Corporal. Esse tema surgiu porque era essa sua linha de pesquisa junto ao Departamento de Pesquisa da Atividade Física Adaptada. Prestei então um exame na UNICAMP, depois fui chamada para uma entrevista com três outros professores do mestradofui aceita. Durante o ano de 2001 cumpri todos os créditos que o curso de pós graduação exigiaconheci outros professores que como a minha orientadora, achavam que o Rolfing era uma coisa qualquer alternativa. Foi me colocando a partir de semináriostrabalhos escritos que apresentei os princípios que fundamentam as intervenções em Rolfingaos poucos os professores passaram a respeitar minha pesquisa.
O convívio com os colegas de lá, também deixou claro quanto o Rolfing é um trabalho misteriosodesconhecido. Misterioso porque existem relatos que a pessoa chora, muda de vidadesconhecido porque o pessoal não tem a menor idéia de como um trabalho corporal pode afetar outros aspectos da pessoa, por incrível que pareça. Um fato curioso aconteceu certa vez. Uma colega de Maringá estava fazendo doutoradojá tinha ouvido falar muito bem do Rolfing no Paraná. Ela me contou que estava almoçando com um sujeito na cantina na Faculdadeao reclamar para ele que sempre tinha uma dor nas costas, o sujeito perguntou onde era a dor, pressionou o local com o cotovelodisse à ela que ?havia feito um Rolfing nela?. Então…. tive que conviver com esse tipo de coisacalmamente esclarecer a situação. Isso é só um exemplo de como somos vistos em alguns lugaresa imensa necessidade de nos colocarmos enquanto pesquisa científica, divulgada nas mais variadas áreas do conhecimento.
Existiram situações muito frustrantes mas todas elas me proporcionaram, de alguma maneira, incentivo para eu procurar respostas bem clarasobjetivas para serem dadasdesse modo, o Rolfing ficou mais claro para mim. O que é realmente o trabalho, o que é exclusivo de nossa metodologia, o que é compartilhado com outras abordagens. Qual é a grande contribuição do Rolfing para a ciência. Percebi também que existem perguntas que são esclarecidas em partedessa maneira nos mantemos curiosos sobre como as coisas acontecem.
Descobri neste processo que existem vários filósofoscientistas que compartilham de alguma maneira com a abordagem do Rolfingquanto somos coerentes em nossas intervenções. Me apaixonei ainda mais pelo Rolfingpelos estudos. O trabalho no consultório mudou completamente. Falo com mais segurança, sei o que estou fazendo, sei também o que não seiacho isso normal. Calmamente olhopesquiso com cada cliente tentando captar como ele é, como é a reação em mim ao conversar, ao olhar, não me obrigando a descobrir tudo de uma vez. Sabendo que dentro daquele comportamento singular existe algo que talvez eu possa propor mas para isso precisamos construir uma relação que dê chance ao sujeito ser como ele é. Antes da pesquisa, eu me obrigava a saber muita coisa das pessoas, antes mesmo de conhecê-las realmente. Hoje estou mais tranqüila nessa relaçãoas coisas acontecem de acordo com o ritmo do clientenão a partir daquele que eu impunha.
Uma das críticas que minha orientadora fazia ao Rolfing® era sobre intervenções com clientes narcisitas. Segundo ela duas pessoas de seu convívio se submeteram ao Rolfingtiveram suas personalidades narcisistas reforçadas. Traduzindo, o narcisista almeja algo que está fora dele, que é idealnão real. Ele não entra em contato com suas próprias sensações, assumindoaceitando quem é realmente. Receber o sujeito em sua singularidade é algo que pode proporcionar inúmeras transformações, principalmente se essa pessoa não foi recebida desse modo em suas primeiras relações. No final da pesquisa minha orientadora acabou concluindo que o Rolfing dá andamento ao processo da pessoa. Ela concluiu isso depois de notar o comportamento de uma cliente sua de psicanáliseoutras 4 de seu convívio.
Quando se faz um mestrado, a exigência sobre o pesquisador é que ele seja capaz de associar idéias dos autores com obras publicadasatravés de um trabalho prático ou não relacionar essas idéias. Um mestrado tem uma exigência maior do que uma especialização ou trabalho de conclusão de curso, assim como a exigência é menor do que um doutorado que requer um certo feito inédito do pesquisador. Uma pesquisa de mestrado se chama dissertaçãode doutorado tem o nome de tese.
Em todas essas situações temos que nos referir aos autores de maneira adequada, tomando cuidado para não nos apropriarmos de certos conhecimentos que são de outros. Na verdade, acho que o conhecimento é algo universalcada um pode dar sua contribuição respeitando que se apoiou neste ou naquele autor para conceber algumas idéias. Aliás, só posso achar alguma coisa aqui neste relato pessoal pois no mestrado não é permitido achar nada. Concluí que fazer um mestrado é como uma série de Rolfing® tem começo meiofim. Um fim que não é um fim realmente mas parte de um processo que precisa de um fechamento senão já começa entrar em outro assunto. Percebi também que pesquisar não é algo impessoal, apesar da maneira formal de escrever. O pesquisador precisa estar inserido numa linha de pesquisa que combine com ele para não haver sofrimento. Existem vários tipos de pesquisa com muitas linhasa medida que nos inteirarmos do assunto, podemos escolher aquela que mais nos agrada.
Uma coisa é certa, a medida que o assunto ficou claro para mim, qualquer pessoa com quem eu conversava, entendia o que eu estava pesquisando.
Minha professora me dizia que quando eu lesse aquilo que estava escrevendo tinha que ser clara o suficiente para a garçonete do bar que eu estivesse, ter subsídios para compreender da maneira dela o que eu estava fazendo. Essa sensação que as vezes eu tinha, sobre o fato de me fazer entender, numa palestra por exemplo, foi se diluindo a medida que eu aprendi que para todo ouvinte, tenho que dar informações suficientes para que ele possa seguir meu pensamentonão adivinhar. Mesmo que meu ouvinte seja um médico, um fisioterapeuta, um professor, não importa. O que eu vou falar irá se somar a informação do ouvinteno final podemos até ter uma discussão. Aprendi portanto a não pressupor que o outro sabeassim me coloquei da maneira mais simples possível contando a história do começo. Assumi que nosso trabalho é muito complexo, envolve muitos aspectosnão tem jeito de ter sucesso querendo dar muita informação.
Um dos professores que compôs minha banca no dia da defesa, mencionou a dificuldade de ensinar conexão entre as partes do corpo na faculdade de medicina. Ele é neuro anatomista, já ensinou na medicinadisse ter encontrado extrema dificuldade em falar de relações anatômicas. Ele considerou muito didático o modo pelo qual apresentei a anatomia, a partir do Rolfing. Também foi falado sobre a contribuição do método em dar alguns esclarecimentos sobre a relação da anatomiaos outros aspectos do ser humano.
Tudo que estou relatando pode ser constatadocontestado por vocês, na leitura da dissertação que está disponível na biblioteca da ABR. Pode ser emprestadatambém xerocada. Tem um erro meu de tradução, na definição do ?felt-sense? que eu acabei concluindo, para me conformar que não afetará a compreensão de um leitor de primeira viagemos entendidos no assunto saberão do que se trata. Depois de ler inúmeras vezes a mesma coisa, algumas passam despercebido! É cruel.
Gostaria agora de compartilhar com vocês, poucas linhas sobre o que pesquisei a respeito da Imagem Corporal. Mais informações podem ser encontradas em meu trabalho, que já mencionei, assim como nas referências bibliográficas nele contidas. Algumas reflexões sobre a Imagem Corporal a partir da metodologia do Rolfing®, talvez saiam publicadas num livro sobre Imagem Corporal que minha professora está organizando. Vários outros colegas estão escrevendo artigos para serem somados a esse livro que pretende atualizar as informações sobre os aspectos fisiológico, emocionalsocial constituintes da imagem do corpo. Participo de um grupo de estudos sobre a Imagem Corporal na UNICAMPo grupo é aberto para os interessados. Quem quiser aparecer é só me contatar que eu passo a programação do semestre. Aqui vão algumas idéias:
As primeiras pesquisas sobre imagem corporal foram feitas por neurologistas, numa época em que supunha-se que a mente era inteiramente biológica. No início, o termo era descrito como um esquema do corpoos pesquisadores não conseguiam explicar como uma pessoa amputada, ainda sentia o membro perdido. Isso era chamado de membro fantasma. Os cientistas começaram então a supor que deveria haver um modelo do corpo criado no cérebroque mesmo depois de amputado, um membro era sentido porque ainda fazia parte desse modelo. Como não tínhamos muitos recursos para as pesquisas neurológicas, os pesquisadores achavam que esse modelo era uma intuição que a pessoa tinha de si mesma. Mais tarde ficou esclarecido que não era uma intuição que formava o modelo de nosso corpo mas sim representações.
Para entendermos imagem corporal é importante entender o que é imagemaí também fica claro o que é uma representação. De acordo com Damásio (2000) Imagens são padrões mentais com uma estrutura construída a partir de sinais provenientes de cada uma das modalidades sensoriais (visual, auditiva, olfativa, gustatóriasômato-sensitiva). Inclui várias formas de percepção tais como: tato, temperatura, dor, muscular, visceralvestibular. O importante é não associar imagem apenas com o sentido visual. Representação por sua vez é uma imagem mental, ou seja um processamento perceptivo-motor de tudo que conhecemos ou iremos conhecer no mundo. Esse processamento acontece em diversas regiões do cérebro. Imagem Corporal portanto refere-se a representação mental de nosso corpo em nosso cérebro. Para nosso sistema nervoso central saber o que é o corpo, as informações são construídas a partir de nossas primeiras relações, a partir de crençainformações que a pessoa tem durante toda sua vida. Em parte essas imagens são inconscientesoutra parte, consciente. Sei que não é fácil compreender tudo isso num parágrafo mas não é minha intenção colocar a coisa de forma extensa. O essencial para o momento é relatar a experiênciadar uma brevíssima idéia sobre o assunto. Hubert Godard fala da imagem do corpotrabalha com isso de forma prática coisa que não existe dentro da Universidade. Consegui fazer muitos links durante o treinamento com ele.
Atualmente, ainda convivemos com confusões terminológicas, distinguindo esquema corporal de imagem corporal. As vezes os cientistas referem-se ao esquema do corpo querendo expressar o ?aparato fisiológico? de maneira isolada. Entretanto existem cada vez mais pesquisas que apoiam o fato de não sermos um pedaço isolado do outro mas sim um todo interconectado. O importante é não confundir imagem corporal com auto-estima, auto-imagem, auto-conceito, muito menos com a imagem que vemos no espelho.
A psicanálise deu uma contribuição imensa no esclarecimento sobre como construímos a imagem de nosso corpohoje temos alguns estudos que discutem a permeabilidade entre desenvolvimento da imagem corporalconstrução do aparelho psíquico.
Paul Schilder foi um pesquisador importantíssimo no esclarecimento da imagem do corpo. Ele reuniu as informações fisiológicas que existiam a respeito do assunto, reconstruiu a visão emocional combatendo algumas idéias de Freudacrescentou o aspecto social. Sobre este último aspecto, ele relata que as imagens corporais são construídasdestruídas a toda momento. Ele relata que o outro é o elemento a partir do qual nós nos descobrimos. Para Shilder (1999), no decorrer de nossa vida, nas nossas relações, trocamos elementos de nossa personalidade com os outros; nossas emoções sempre se referem a alguém ou a alguma coisa com a qual nos identificamos. O mesmo acontece com nossos pensamentos. Ao mesmo tempo que somos capazes de nos colocar num relacionamento, estamos nos comunicando através de nossa imagem corporal. Quando ouvimos a opinião dos outros, nos identificamos ou não com alguns elementos dela, fazendo com isso uma troca permanente. Schilder cita, entre outros, a imitaçãoa identificação como mecanismos que sustentam o aspecto social da imagem do corpo.
Se pensarmos que o ambiente de uma sessão de Rolfing® evidencia a relação entre rolfistacliente, podemos pensar sobre as trocas constantes entre as imagens corporais que acontecem durante as sessões. Partes conscientes, outras não. Muita coisa subliminar. Aspectos que poderíamos discutir se tivéssemos um fórum brasileiro, por exemplo, só para atualização de informaçõestrocas de experiências.
Estou aguardando os comentários de quem leu minha dissertação. Perguntas, críticas ou simplesmente colocações. Dediquei o trabalho a vocês, colegas rolfistas porque acho nosso trabalho muito importanteficar solitariamente pesquisando no consultório, pode ser gratificante por um período mas compartilhar os resultados da pesquisa pessoal/profissional, pode colocar nossa profissão em evidência no universo acadêmicodesta maneira sermos reconhecidos enquanto instituição. É o aspecto social de nosso trabalho em desenvolvimento.
Bibliografia
Damásio, A. O Mistério da Consciência São Paulo: Companhia das Letras, 2000
Schilder, P. A Imagem do Corpo – Energias construtivas da psiquê São Paulo: Martins fontes, 1999
As you register, you allow [email protected] to send you emails with information
The language of this site is in English, but you can navigate through the pages using the Google Translate. Just select the flag of the language you want to browse. Automatic translation may contain errors, so if you prefer, go back to the original language, English.
Developed with by Empreiteira Digital
To have full access to the content of this article you need to be registered on the site. Sign up or Register.